Barco ao mar







Em tardes mornas de primavera eu deitava na grama olhando o céu.  Fechava os olhos e imaginava um mar safira com espumas brancas, onde pequeno barco com vela carmim balançava ao sabor do vento e da água. Dentro, apenas eu sentada com os olhos mergulhados naquela imensidão azul. O único ruído era o murmurar de pequenas ondas no casco da embarcação. O mundo inteiro se resumia ao que os meus olhos alcançavam. Sem passado e sem futuro o tempo era aquele. A ampulheta parava, os relógios congelavam seus ponteiros, a vida estava suspensa naquele instante mágico. Dores e temores, medos e ansiedades tudo sumira no abissal abismo do oceano. Uma doce paz ocupando todos os espaços, enchia corpo e alma de uma gostosura cálida, crescendo até explodir num êxtase de pura felicidade.

Abrindo os olhos, ancorava meu barco de sonhos num porto imaginário, recolhia a vela e esvaziava o mar. Ficavam guardados para momentos de sonhos e devaneios em outras tardes primaveris. Durante meu tempo de menina fui marinheira de muitas viagens e desbravei oceanos mundo afora. Hoje meu mar é uma página branca que preencho de palavras, tal como pequenas embarcações que carregam sonhos, sentimentos, dores, amores, esperanças. Sou maruja da escrita, navego no universo da palavra e em minhas viagens vou deixando um rastro de sentimentos que ondulam no mar da vida.

Amor primeiro




O primeiro amor chegou em asas translúcidas de libélula e tinha o perfume de rosas recém-colhidas. Foi tecido por olhares furtivos e toques roubados por mãos tépidas que ofereciam doces sonhos enrolados juntos com balas em papel carmim. Trazia em sua inocência o leve rubor de romãs em fase de maturação.

Durou exatamente as fases da lua. Não mais. Foi o tempo exato e ideal como deve ser o tempo de um primeiro amor, uma vez que para ele não há amanhãs. Não teve começo. Foi descoberto da mesma forma quando se olha o céu e vê-se a lua nova fininha. Em que fração de momento terá ela aparecido? Não se pode afirmar ao certo quando. Da mesma forma, um dia qualquer ao olhar aquele alguém sentimos uma onda morninha tomar conta de nós e nossos olhos enchem-se de estrelas.

Entre risos e brincadeiras, sempre em meio a mil vozes, aquilo que não se sabe explicar fica em quarto crescente, enchendo as manhãs, povoando as tardes e transformando-se em sonhos à noite. Em castelos oníricos príncipe e princesa pulam corda de mãos dadas e correm abraçados por jardins pontilhados de pequenas flores do campo. Molham os pés em águas de regato límpido que desliza murmurante entre a relva macia.

Há uma reverberação tão grande em dado momento, que a vida tingida de prata fica presa num átimo como se ali fosse o único lugar onde deveria realmente estar: plena, inexplicável, pérolas de felicidade pairando sobre o mundo. Num círculo de luz argêntea há um amor puro que circula como casal valsando ao som de violinos. A perfeição envolve tudo em camadas de tinta multicolorida. O beijo úmido, rápido, a espera de ser roubado acontece. Rostos corados, espanto nos olhos, pés que correm em direções opostas...

O que brilhou em perfeição tal, começa a esmaecer sem explicação. Como um ciclo que deve ser cumprido... Guarda-se o primeiro amor em lugar exclusivo, afinal não se perde o primeiro amor uma vez que ele será sempre o primeiro... Sem perdas e danos essa será a joia mais bela e conservada por toda vida: o amor da inocência.

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